Em entrevista, presidente também lamentou envolvimento de petistas com corrupção na Petrobras
BRASÍLIA
- A presidente Dilma Rousseff admitiu nesta segunda-feira que “talvez” ela e a
equipe econômica tenham cometido o erro de demorar a perceber o tamanho da
crise.
Dilma admitiu que “talvez” fosse o caso de ter adotado medidas
corretivas ainda no ano passado, inclusive antes das eleições.
Ela relatou que
o governo levou muitos sustos, pois nunca previu uma queda tão brutal da
arrecadação.
Para a presidente, no cenário econômico internacional “o futuro é
imprevisível”.
— Errei
em ter demorado tanto para perceber que a situação era mais grave do que
imaginávamos.
Talvez, tivéssemos que ter começado a fazer uma inflexão antes.
Não dava para saber ainda em agosto.
Não tinha indício de uma coisa dessa
envergadura. Talvez setembro, outubro, novembro — disse Dilma em entrevista ao
GLOBO e aos jornais “Folha de S.Paulo” e “O Estado de S. Paulo”.
Mesmo
assim, a presidente defendeu as políticas adotadas ano passado, no período
eleitoral.
Lembrou que o governo sustentou os investimentos e a taxa de juros
de 2,5% ao ano; manteve a desoneração da folha de pagamento no valor de R$ 25
bilhões; e concedeu subsídios para todos os empréstimos de longo prazo
realizados no Brasil (a juros mais baixos).
“PODERIA
TER FEITO UMA ESCADINHA”
Dilma
acrescentou que, em alguns casos, o governo não voltou atrás, e citou a
desoneração da cesta básica.
Explicou que adotou uma política para preservar o
emprego e a renda, mas que essa política poderia ter sido reduzida
gradativamente ao longo do tempo, adotando o que chamou de “escadinha”.
Nesse
caso, também se justificou:
— O que é
possível considerar é que poderia ter começado (a fazer) uma escadinha.
Agora,
eu nunca imaginaria, ninguém imaginaria que o preço do petróleo cairia de 105 dólares
(o barril) em abril, para 102 dólares em agosto, para 43 dólares hoje.
A crise
começa em agosto, mas só vai ficar grave, grave mesmo, mesmo entre novembro e
dezembro (de 2014).
É quando todos os estados da Federação percebem que a
arrecadação caiu.
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Ainda
sobre a economia internacional, Dilma disse que “o futuro é imprevisível”.
As
dificuldades, segundo ela, não ficarão restritas aos exportadores de
commodities para a China, pois também afetam os países que exportam máquinas e
equipamentos para aquele país.
A política de industrialização da China foi
acelerada, e todos os países estão perdendo arrecadação.
Nos
países que compõem os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul),
predominava a avaliação de que a crise seria superável, segundo a presidente.
Mas, depois do acordo entre Estados Unidos e Irã, que colocará de 2 milhões a 3
milhões de barris de petróleo no mercado internacional, o primeiro-ministro
russo Vladimir Putin previu que a renda com o petróleo vai afundar.
— Ninguém
podia imaginar — lamentou a presidente.
"LAMENTO
PROFUNDAMENTE"
Em
relação à Operação Lava-Jato, Dilma declarou que não esperava que petistas e
pessoas próximas ao partido estivessem envolvidas no escândalo de corrução na
Petrobras.
Ela afirmou que foi pega de surpresa com o escândalo, e que lamenta
o que aconteceu.
O GLOBO perguntou se Dilma imaginava anteriormente que
militantes ou pessoas ligadas ao PT estivessem envolvidas no escândalo da
Petrobras:
— Não! —
reagiu a presidente.
Questionada
se fora completamente surpreendida, confirmou:
— Fui!
E
lamento profundamente!
Posso falar uma coisa.
Sou a favor de uma coisa que o
Márcio Thomaz Bastos (ex-ministro da Justiça, morto ano passado) dizia.
Não
esperem que sejam as pessoas a fonte da virtude.
Tem que ser as instituições.
As instituições é que têm de ter mecanismo de controle. É muito difícil.
Integra
a corrupção o fato de ela ser escondida, clandestina e obscura.
Dilma não
quis falar do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Esquivou-se
dizendo que não tem opinião sobre qualquer pessoa.
Para a presidente, quanto
mais rápidas e efetivas forem as investigações, melhor para o país.
— Prefiro
não falar sobre pessoas. Eu estou budista.
Hoje sou Dilminha paz e amor —
afirmou ela.
Sobre o
escândalo na Petrobras, garantiu que ninguém pode interromper o processo em
curso no Judiciário e nos órgãos de investigação (Polícia Federal e Ministério
Público).
Essa postura, diz ela, deve ser mantida mesmo que as investigações
afetem a cadeia da indústria de óleo e gás e da construção civil.
— Ninguém
pode chegar à Presidência e olhar para processos de corrupção como uma coisa
pessoal.
Só pode olhar e ver que o país deu um passo e foi para frente.
Agora,
sou a favor, em qualquer circunstância, do direito de defesa.
É isso que torna
a democracia forte.
Ao
abordar as implicações políticas da crise, Dilma fez uma ironia quando os
jornalistas lembraram que o ex-presidente Fernando Henrique sugeriu que ela
renuncie ao mandato.
— Sugerir é
fácil!
Não vou discutir.
A
presidente procurou minimizar conflitos com o vice-presidente Michel Temer e o
ex-presidente Lula.
Afirmou que quem tentar afastá-la de Lula não conseguirá.
Disse que foi um desserviço ao país a bomba no Instituto Lula.
Fez questão de
afirmar também que suas relações com Temer são de lealdade, e que foi um
sucesso o trabalho do vice na articulação política, pois foram aprovadas as
medidas de ajuste fiscal.
— Temer
tem sido de imensa lealdade comigo.
Nós tivemos uma primeira fase da
articulação política coordenada pelo Temer.
Qual é o resultado dessa fase? Um
sucesso.
Conseguimos aprovar as medidas do reequilíbrio fiscal.
E estabelecemos
uma relação com o Congresso.
A gente perde e a gente ganha no Congresso.
Cada
vez que a gente perde é uma crise? Não é.
REDUÇÃO
DE MINISTÉRIOS
Dilma
informou nesta segunda-feira que vai acabar com dez ministérios e que vai
reduzir mil cargos de livre provimento ou funções gratificadas.
Explicou que o
objetivo principal é racionalizar a máquina, mas que também haverá corte de
gastos.
Pois, se isso não ocorrer, essas medidas, segundo ela, seriam
“demagógicas”.
Além de ministérios, serão extintas secretarias.
— Tem
ministério com número de secretarias que foram sendo ampliadas ao longo dos
anos.
Então, agora, vamos passar todos os ministérios a limpo — disse a
presidente.
Ela se
negou a dizer quais as pastas serão fechadas. Explicou que o estudo ainda está
sendo concluído.
Essa cautela decorre, segundo ela, do fato de que será
necessário fazer uma composição política com os partidos.
Pois mesmo os que são
a favor da redução do número de ministérios podem ter críticas sobre
determinadas mudanças.
— Todo
mundo é a favor.
Todas as torcidas são a favor.
Uma reforma dessas não se faz
dentro do gabinete, sozinha — explicou Dilma.
Essa
redução das pastas, segundo ela, passará também por consultas à sociedade.
O
governo pretende ouvir os segmentos empresariais afetados pelas mudanças.
Uma
das metas é racionalizar a máquina e acabar com as sobreposições de funções.
— Minha
meta não pode ser irracional — disse a presidente.
O
objetivo do governo continua sendo retomar o crescimento, em dois ou três anos,
antes das novas eleições presidenciais, em 2018.
Segundo Dilma, um dos dados
favoráveis nesse sentido é o que ela chamou de “embicamento” da inflação, além
das políticas de investimento em logística e energia elétrica.
ESTABILIDADE
DAS INSTITUIÇÕES
A
estabilidade das instituições financeiras do país foi apontada pela presidente
como um dos elementos positivos.
Mas ela adiantou que as reformas vão
continuar.
Mudarão o PIS/Cofins e o ICMS, e o governo também quer reduzir
gastos obrigatórios.
A Previdência Social responde por 55% desses gastos fixos,
fruto de ter aumentado a expectativa de vida em 4 anos e meio, nos últimos 13
anos.
Sobre a
crise na China, Dilma explicou que a Bolsa chinesa sofreu uma queda grande, e
isso se refletiu na derrubada de todas as Bolsas, inclusive de Japão, Taiwan,
Coreia do Sul e Austrália.
— Estamos
diante de retração do mercado internacional da qual não se sabe a dimensão, não
se sabe.
Vamos ter de saber lidar com a desaceleração internacional.
Segundo
Dilma, o governo tem sido prudente e tem tomado as medidas necessárias para o
país enfrentar essa situação.
E isso significa aprofundar o equilíbrio das
contas públicas.
Esse esforço, disse ela, vai ter que ser feito
sistematicamente, considerando a situação do mercado internacional.
— Não
estou levantando (o tema da) China para falar que amanhã tem uma catástrofe.
Não estou dizendo isso — disse a presidente. — Estou dizendo que tem uma
situação de desaceleração internacional, e vamos ter que saber lidar com ela.
Não atinge só a nós.
Até eu voltar da reunião dos Brics, achava que essa
situação era superável.
Só não contava com essa queda sistemática.
Estava
achando que era superada por tudo o que eu sabia, por tudo o que eu escutei.
Ia
ter dificuldades, mas você não ia ter uma situação muito difícil.
A partir de
hoje, eu não sei. Ninguém sabe.
Nós temos o interesse de voltar a crescer.
Não
estou fazendo o reequilíbrio das contas públicas em si.
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