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domingo, junho 25, 2017

Por que a J&F comprou uma usina 'mico' e, segundo delação, ofereceu propina por contrato da Petrobras?


Depois de pedir a ajuda de Rocha Loures, J&F conseguiu um contrato de gás com a Petrobras em 13 de abril; em seis semanas, usina que usa o gás pode ter rendido mais de R$ 80 milhões em lucro.


Vista aérea da Usina Termelétrica Mário Covas, conhecida como UTE de Cuiabá, atualmente propriedade da Âmbar Energia, do grupo J&F, de Joesley Batista (Foto: Divulgação/Âmbar Energia) 
Vista aérea da Usina Termelétrica Mário Covas, conhecida como UTE de Cuiabá, atualmente propriedade da Âmbar Energia, do grupo J&F;, de Joesley Batista (Foto: Divulgação/Âmbar Energia).
 
 
Uma usina termelétrica de Cuiabá está no centro do escândalo que levou o presidente Michel Temer a ser investigado pelo crime de corrupção passiva. 
 
 Foi por causa desse negócio que o grupo de Joesley Batista entregou uma mala com R$ 500 mil ao ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, que está preso. 
 
A UTE Cuiabá foi comprada pelo grupo J&F, dono do frigorífico JBS, em 2015. A usina ficou anos parada por falta de fornecimento de gás e era considerada um "mico". 
 
Mas Joesley tinha outra visão: "Esse é o maior 'deal' [negócio] que pode existir", disse a Rocha Loures em uma conversa divulgada na sua delação premiada. 
 
A usina foi construída no fim dos anos 90 pela companhia de energia americana Enron, que ficou famosa anos depois por um dos maiores escândalos de fraude contábil dos EUA. 
 
Todo o projeto se baseava na compra de gás da Bolívia, por meio de um gasoduto da própria usina. Mas, em 2006, o governo de Evo Morales rompeu o contrato de fornecimento. 
 
A usina parou de funcionar. Com a quebra da Enron, o fundo americano Ashmore assumiu seus negócios, entre eles, a usina parada. 
 
Em 2011, o Ashmore arrendou a termelétrica à Petrobras e ela voltou a operar. O grupo de Joesley comprou a usina em 2015, na época em que o Brasil vivia uma das mais severas crises hídricas e os donos de usinas termelétricas ganharam muito dinheiro. 
 
O grupo de Joesley entendia que era mais vantajoso operar diretamente a usina do que arrendar para a Petrobras. Na sua conversa com Loures, Joesley dá detalhes do potencial do negócio:
"Quando eu comprei, ela tava alugada pra Petrobras, porque o dono antigo cansou de brigar com a Petrobras. (...) E aí a Petrobras meio que obrigou ele... A única saída que ele teve foi alugar. Por quanto? Um milhão e meio por mês!

Dezoito milhões por ano! Dezoito milhões por ano! (...) A Petrobras, Rodrigo, pra você ter uma ideia, 2015, que a energia foi a 800, foi muito caro, a Petrobras ganhou 2 bilhões naquela EPE (usina) em um ano.

E pagou 18 milhões pro dono."
Ouça abaixo a íntegra da conversa entre Joesley e Rocha Loures, realizada em Brasília:
Íntegra da conversa gravada entre Joesley e Rocha Loures em 16 de março, em Brasília
Íntegra da conversa gravada entre Joesley e Rocha Loures em 16 de março, em Brasília
A Petrobras não confirma os números mencionados por Joesley e diz que seus custos de aluguel e operação na usina eram "bem superiores" a R$ 18 milhões por ano.
 
O grupo de Joesley seguiu com o plano de assumir a usina e rescindiu o contrato de locação com a Petrobras em setembro de 2015. 
 
O risco de tirar a Petrobras do negócio era a falta de garantia de fornecimento de gás. A Âmbar, empresa de energia da J&F, assumiu as operações em março de 2016.
 
O grupo de Joesley queria um contrato de longo prazo para comprar gás da Petrobras, mas as negociações entre as empresas não avançaram. 
 
Depois que os dois contratos de curto prazo acabaram, em janeiro de 2016, a usina ficou praticamente parada o ano todo e só produziu energia por 21 dias. 
 
Se tivesse matéria-prima disponível, a usina seria ligada sempre que o valor da energia no mercado, que varia a cada semana, for vantajoso.
Na sua delação, Joesley relatou que deixa de ganhar de R$ 1 milhão a R$ 3 milhões por dia quando a usina está desativada. Foi nesse contexto que a J&F ofereceu propina para destravar o negócio.

Briga no Cade e apelo a Temer

A J&F foi ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra a Petrobras em setembro de 2015. Sob o argumento de que a Petrobras é monopolista no fornecimento de gás, o grupo pedia ao Cade para intervir na questão e viabilizar o fechamento de contrato de fornecimento em condições favoráveis.
 
Enquanto o caso corria no Cade, Joesley levou a questão ao presidente Michel Temer em encontro no dia 7 de março, segundo sua delação. 
 
O empresário disse que seguiu as negociações sobre o caso com Rocha Loures após a indicação de Temer (ouça abaixo).
Áudio de gravação da conversa entre Joesley Batista, dono da JBS, e o presidente Michel Temer, em 7 de março de 2017, no Palácio do Jaburu
Áudio de gravação da conversa entre Joesley Batista, dono da JBS, e o presidente Michel Temer, em 7 de março de 2017, no Palácio do Jaburu.
 
A intenção de Joesley era conseguir que os políticos viabilizassem um contrato de longo prazo com a Petrobras para fornecimento de gás. 
 
A promessa era pagamento semanal de propina por até 25 anos, com valores que variam conforme o preço da energia. 
 
Em conversa com Loures no dia 16 de março, na residência do então deputado, ele explica o potencial do negócio:
"Esse negócio, essa térmica, é o maior 'deal' que pode existir. Que que é o negócio, seguinte: Se nós conseguir isso, primeiro passo: um milhão, dois milhão, três milhão por dia! "

Contrato com a Petrobras

No dia 13 de abril, menos de um mês após a conversa entre Joesley Batista e Rodrigo Rocha Loures, o dono da JBS conseguiu um contrato com duração até 31 de dezembro de 2017. 
 
Esse contrato resolveu provisoriamente o impasse entre a empresa e a Petrobras.
 
A contrapartida à ajuda de Rocha Loures foi combinada no próprio dia 16 de março:
  • Joesley Batista: O Temer mandou falar, eu vou falar pra você: nós vamos abrir, desse negócio aí, 5%.
  • Rocha Loures: Tudo bem. Tudo bem.
  • Joesley Batista: Pronto. E... Só que aí, nós faz isso no curto prazo. Aí nós temos que correr pra fazer um "deal" de longo prazo.
Depois que o contrato foi fechado, em conversa gravada no dia 24 de abril, Ricardo Saud, diretor de Relações Institucionais da J&F, comemorou o acordo em uma reunião com Rocha Loures em São Paulo (leia abaixo a transcrição de trecho da conversa, e ouça-a na íntegra no vídeo a seguir, a partir de 1 hora e 20 minutos):
  • Saud: O Joesley mandou te agradecer, e é muito, não é pouco não. Porque quanto tempo esses caras ficaram pra fazer isso, quanto tempo! E aquilo que você fez? (...) Ele pediu pra você não esquecer que esse negócio aqui é um ano só. E você que conseguiu, tá lembrado?
  • Loures: Uhum.
  • Saud: Então, mas depois de um ano, acabou. Tá lá, tem dinheiro semanal, mas depois acabou.
Em 24 de abril, Ricardo Saud gravou conversa com Rodrigo Rocha Loures combinando o pagamento de propina semanal de até R$ 1 milhão por pelo menos um ano
Em 24 de abril, Ricardo Saud gravou conversa com Rodrigo Rocha Loures combinando o pagamento de propina semanal de até R$ 1 milhão por pelo menos um ano
Na conversa, os dois combinam o pagamento de propina semanal. 
 
A J&F pagaria R$ 500 mil nas semanas em que o PLD (preço de liquidação das diferenças, valor de venda da energia no mercado livre) ficasse entre R$ 300 e R$ 400 por megawatt-hora (MWh). Se o preço de energia fosse abaixo de R$ 300 MWh, a propina seria zero. 
 
Mas, se fosse acima de 400 MWh, a J&F entregaria R$ 1 milhão a Rocha Loures.
 
Segundo Saud, entre os dias 15 e 21 de abril, na primeira semana após o fechamento do contrato de fornecimento com a Petrobras, o PLD foi de R$ 350. "Quando o PLD é acima de 300 o combinado foi 500 mil por semana", disse, na gravação. 
 
Na sequência, eles combinam como será feita a entrega da primeira parcela a Loures. 
 
O deputado cassado foi filmado recebendo uma mala de R$ 500 mil quatro dias depois.

Negócio lucrativo

Em sua conversa com Loures, Joesley explica que, se o preço da energia (PLD) superar R$ 165 por MWh, o negócio é lucrativo. 
 
O PLD é calculado toda semana e tem preços diferentes por região do país, considerando uma série de fatores, como a previsão de chuvas e a disponibilidade de combustível.
 
De acordo com Joesley, o PLD de 165 é o "break even" da usina. 
 
Isso quer dizer que, sempre que o PLD for acima de R$ 165, a usina gera lucros à Âmbar. 
 
Dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) mostram que o valor do PLD desde que a J&F conseguiu o contrato de gás com a Petrobras (em 13 de abril), sempre foi pelo menos o dobro do ponto de "break even". 
Veja abaixo: 
 
PLD semanal da usina de Cuiabá.
 
Veja qual foi o preço médio em reais por megawatt-hora da usina desde que a J&F conseguiu um contrato de preço fixo com a Petrobras
Preço de Liquidação de Diferença (PLD, medido em R$/megawatt-hora)351,85351,85331,2331,2450,54450,54464,54464,54478,38478,38478,68478,6815 a 21 de abril22 a 28 de abril29 de abril a 5 de maio6 a 12 de maio13 a 19 de maio20 a 26 de maio0100200300400500600
Fonte: Câmara de Comercialização de Energia Elétrica
 
Em março, Joesley comentou com Rocha Loures que o preço de energia estava subindo. 
 
Ele afirmou que isso o deixava "em desespero", já que a usina estava parada.
"Agora a energia subiu.


Agora a energia tá em 230. Com 230, o meu 'break even' é 165. Você tem uma noção de número? O 'break even' é 165, se ela for a 265, eu ganho 100 reais por megawatt. (...) A cada 100 reais significa um milhão por dia. Que eu ganho. (...) Ou seja, 300 milhões no ano. 360 milhões num ano!"
Isso quer dizer que, pelas contas de Joesley, o lucro da empresa com a produção de energia, desde que ela conseguiu o contrato de gás com a Petrobras em 13 de abril, pode ter variado entre pelo menos R$ 7 milhões e R$ 21 milhões por semana, podendo superar os R$ 80 milhões entre 13 de abril e 26 de maio. 
 
A usina poderia dar ainda mais dinheiro em tempos de crise hídrica. Se fosse acionada pelo Operador Nacional do Sistema (ONS), os preços seriam ainda maiores. 
 
Na "ordem" de custo das 37 usinas da região Sudeste/Centro-Oeste, a UTE de Cuiabá é uma das mais caras: ela ocupa a 28ª posição. Em 2015, ela foi acionada pelo sistema durante 350 dias do ano. 
 
Desde então, ela só produziu energia por conta própria, o que significa que ela vendeu energia seguindo o PLD (caso a usina seja acionada pelo sistema, ela ganha mais pela energia produzida). 
 
Segundo Ildo Sauer, professor da Universidade de São Paulo (USP) e ex-diretor de gás da Petrobras, um dos motivos para o Operador não acionar a UTE de Cuiabá é o fato de que, a partir de 2016, o Brasil começou a sair da crise energética que teve início em 2012, e "o sistema elétrico passou a estar equilibrado".

Petrobrás cancelou acordo

Apesar de ressaltar que não cedeu a pressões da J&F e que o contrato firmado não é comercialmente prejudicial, a Petrobras anunciou em 8 de junho o rompimento do contrato.
"A Petrobras tomou conhecimento das gravações de delações premiadas de executivos do grupo J&F, de que cometeram atos que violam a legislação anticorrupção vigente", disse a empresa, que também afirmou que vai pedir indenização de R$ 70 milhões à J&F pelo descumprimento de cláusulas contratuais.
 
A Petrobras afirmou que preço de importação do gás da Bolívia é de US$ 4,29 por milhão de BT (dimensão para gás), e o preço acordado de venda do gás para a termelétrica de Cuiabá era de US$ 6,07 por milhão de BTU. 
 
A estatal ressaltou que a demanda do grupo J&F era que o preço fosse consideravelmente mais baixo (o preço de custo do gás importado da Bolívia mais 2,5%). 
 
"O contrato de fornecimento de gás assinado pela Petrobras com a térmica de Cuiabá em 13/04/2017 tem valor 41% superior ao do produto importado da Bolívia, refletindo a política comercial em vigor, exatamente as mesmas condições de mercado aplicadas a outros contratos de venda de gás assinados recentemente pela Petrobras", disse a estatal, em nota ao G1
 
Ainda segundo a Petrobras, o valor do gás não é fixo, e sofre atualizações trimestrais que seguem, como indicador uma combinação de preços de óleo e gás, e não varia de acordo com o PLD. 
 
Em comunicado, a Âmbar disse "que compra gás da Petrobras desde 2015 e está no seu terceiro contrato, e todos os negócios da UTE Cuiabá foram fechados entre as empresas diretamente, com longas negociações, sem interferências políticas no assunto".
 
A empresa afirmou ainda que "sempre buscou comprar gás diretamente da Bolívia, onde seu gasoduto está conectado, porém, uma vez que a Petrobras tem um contrato preferencial junto a YPFB Boliviana, a empresa se viu obrigada e negociar com a estatal". 
 
"Durante as tratativas, a Âmbar sempre buscou uma relação de longo prazo, porém a Petrobras nunca pode assumir tal compromisso uma vez que os seus contratos com a Bolívia terminam entre 2019 e 2021", completou a empresa de energia da J&F.

Negócio depende da Petrobras

O avanço do grupo de Joesley Batista no setor de energia é parte de um projeto de diversificação de negócios do conglomerado. Além de investir no setor de carnes, o grupo também é dono de uma empresa de celulose, de um canal de televisão e da Alpargatas, por exemplo. 
 
Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), explicou ao G1 que o grupo já atua na área de energia, mas em um negócio diferente, ligado diretamente à criação de gado. 
 
"Ela tem negócio na área de energia, mas de biodiesel. 
 
Ela é fabricante de biodiesel de sebo de boi. Como ela é a maior produtora de proteína animal do mundo, ela acaba produzindo muito sebo." 
 
Assim como o negócio de carnes, o setor de energia elétrica prometia render muito dinheiro à J&F. Mas há uma diferença fundamental entre os dois negócios: a matéria-prima. 
 
Para fabricar biodiesel, o grupo tem fácil acesso ao sebo de boi. Já para produzir energia elétrica, a Âmbar Energia, holding da J&F que controla a UTE de Cuiabá, precisa de gás natural boliviano. 
 
Segundo especialistas consultados pelo G1, a Bolívia também tem contratos com outras estatais, como a da Argentina, e poderia vender gás diretamente para uma empresa privada brasileira.
 
Porém, por se tratar de um novo contrato e equivalente a menos de 10% do volume de gás contratado pela Petrobras, as condições de preço e prioridade provavelmente seriam menos vantajosas que as do acordo vigente da estatal. 
 
Lucien Belmonte, superintendente da associação dos produtores de vidro, um setor que também usa o gás como matéria-prima, afirma que "a Petrobras continua correspondendo a 97% da oferta de gás do mercado brasileiro". 
 
Ele também explica que a Âmbar pode comprar gás direto da Bolívia, mas precisaria antes se registrar como consumidor livre na Agência Nacional do Petróleo (ANP), seguindo os parâmetros da lei do gás de 2009.

Outros lados

O que diz Michel Temer: Sobre os fatos delatados por Joesley e Ricardo Saud ao Ministério Público Federal, o presidente Temer negou a denúncia de corrupção passiva. "Convenhamos, no caso central de sua delação, fica patente o fracasso de sua ação. 
 
O Cade não decidiu a questão solicitada por ele. O governo não atendeu a seus pedidos. 
 
 
O G1 procurou o advogado de Temer para comentar as gravações em áudio entre Rocha Loures e os delatores da JBS, que citavam seu nome, mas não recebeu resposta. 
 
O que diz Rodrigo Rocha Loures: O ex-deputado devolveu à Polícia Federal a mala e a quantia de R$ 500 mil
 
Em maio, o G1 questionou sua assessoria de imprensa sobre os fatos gravados nas conversas com executivos da JBS, mas não obteve resposta. 
 
 
Em um pedido de habeas corpus, sua defesa acusou a Procuradoria-Geral da República de "coação ilegal" e diz que, após o primeiro pedido de prisão ter sido rejeitado, o peemedebista "se achava em absoluto cumprimento das cautelares pessoais, em sua residência, com sua esposa no oitavo mês de gravidez, onde estava praticamente recluso, não saía face à exposição midiática a que ele e seus familiares foram expostos". 
 
O que diz a Âmbar, do grupo J&F: Após a publicação desta reportagem, a Âmbar afirmou, em comunicado enviado ao G1, que a usina de Cuiabá "se trata de um ativo operacional e gerador de caixa, e não de um 'mico'". 
 
A companhia afirmou ainda que "quanto à informação de propina para Rodrigo Rocha Loures, os documentos e informações dos relatos do acordo de colaboração referem-se à atuação de executivos da J&F e foram entregues e encontram-se em poder da Justiça".

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