PF afirma que não há um chefe-mor na quadrilha. Benefícios fiscais levaram Estado ao colapso, afirma o delegado Alexandre Ramagem.
Por Alessandro Ferreira e Gabriel Barreira, G1 Rio
A Operação Cadeia Velha, desdobramento da Lava Jato desencadeado nesta
terça-feira (14), aprofundou as investigações de desvios de verba
pública no Estado do Rio e concluiu que não há um "chefe-mor" da
quadrilha.
Na verdade, dizem os investigadores, agora há vários entes à
frente do esquema — e não só o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).
- A operação Cadeia Velha investiga o uso da presidência da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e de outros cargos na Casa para a prática de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas
- O alvo da operação é o pagamento de propina a políticos pela Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor)
- Foram presos: o empresário Felipe Picciani; o empresário Jacob Barata; o ex-presidente da Fetranspor Lélis Teixeira; e mais 6 pessoas
- Foram conduzidos coercitivamente a prestar depoimento: o presidente da Alerj, Jorge Picciani; e os deputados estaduais Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do PMDB
- Os pedidos de prisão preventiva contra os três deputados, que têm foro privilegiado, serão analisados na quinta-feira (16) pelo TRF-2
- As investigações apontam que a cúpula da Alerj formou uma organização criminosa que vem se estruturando desde a década de 1990, integrada também por Cabral
"Constata-se que o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Tribunal de
Contas [do Estado do Rio], que deveriam ser autônomos, independentes,
com dever de fiscalização recíproca, na realidade estão estruturados em
flagrante organização criminosa com o fim de garantir contínuo desvio de
recursos públicos e lavagem de capitais", afirma o delegado da Polícia
Federal Alexandre Ramagem Rodrigues.
De acordo com a Polícia Federal, havia "excessivos benefícios fiscais" a
empresas de transporte e empreiteiras, fazendo com que o Estado
deixasse de receber mais de R$ 138 bilhões. Em troca das isenções, os
parlamentares ganhavam propina.
Para o delgado Ramagem, a corrupção causou o colapso da economia fluminense.
"Segmentos empresariais pagavam rotineiramente propina para agentes
políticos, não só no Legislativo mas também no Executivo e no próprio
TCE, em troca de atos de ofício", explica o procurador-regional Carlos
Alberto Gomes de Aguiar.
A afirmação foi feita durante entrevista
coletiva nesta terça, após o pedido de prisão preventiva dos deputados.
"Através da agremiação política que detém hegemonia do Estado do Rio de
Janeiro, e com ocupações estratégicas em diversos orgãos públicos, vêm
ganhando força política quase insuperável e enriquecendo
assustadoramente.
Enquanto o Rio de Janeiro definha nesse caos social,
esses sujeitos se empapuçam com dinheiro da corrupção", completou.
'Terceirização' da lavagem de dinheiro
Jorge Picciani é suspeito de desviar dinheiro através de uma empresa do
ramo da agropecuária, a Agrobilara.
Para os investigadores, é uma das
formas mais simples de se lavar dinheiro: chance de manipulação de
preço, baixa tributação e pouca fiscalização, aponta o MPF.
"A Agrobilara chegou a um nível de sofisticação de lavagem [de
dinheiro] que não faz só a lavagem de Picciani.
Ela já terceirizou esse
serviço e lava de outras pessoas, seja de empresários, seja de
servidores públicos", afirma a procuradora Andréa Bayão Pereira Freire.
Organização tentou retomar o controle das contas
Personagem que até então não havia sido citado nas investigações de
corrupção no estado, o deputado estadual Edson Albertassi foi trazido
para o centro do escândalo pela operação Cadeia Velha.
Apontado como destinatário de propinas pagas por empresários de ônibus
por mais de um ano, o parlamentar foi citado como ponta de lança da
organização criminosa ao ser indicado para uma vaga de conselheiro do
Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ).
A nomeação de Albertassi foi suspensa pela Justiça na segunda-feira (13).
De acordo com os procuradores, Albertassi foi indicado ao TCE para que a
organização criminosa retomasse o controle das contas, interrompido
após a prisão de seis dos sete conselheiros, na Operação Quinto do Ouro.
Apesar dos indícios de que a quadrilha se movimentava para manter os
esquemas de corrupção em atividade, nenhum dos investigadores quis
comentar se a indicação do deputado compromete o governador Luiz
Fernando Pezão, que vem enfrentando diversas ações judiciais por bancar o
nome de Albertassi à Corte.
Entre fevereiro de 2016 e maio deste ano, Albertassi recebeu repasses
de cerca de R$ 60 mil mensais.
"Segundo delatores, a intenção era ter o
líder do governo sempre ao lado dos empresários corruptores.
É o mesmo
raciocínio que os levou a financiar Jorge Picciani e Paulo Melo: eles
são fortes politicamente, e esses empresários os colocaram no bolso",
afirmou o procurador Carlos Alberto Aguiar.
O que dizem os suspeitos
Jorge Picciani: "O que aconteceu hoje com meu filho é uma covardia
feita para atingir tão somente a mim.
Felipe é um zootecnista, bom pai,
bom filho, bom amigo, que trabalha de sol a sol e não tem atuação
política.
Todos que o conhecem o respeitam e sabem do seu caráter e
correção".
Jacob Barata Filho: "A defesa de Jacob Barata Filho não teve acesso ao
teor da decisão que originou a operação de hoje da Policia Federal e,
por isso, não tem condições de se manifestar a respeito".
Lélis Teixeira: "A defesa se manifestará quando tiver examinado os autos.
Ainda não conseguimos acesso."
Edson Albertassi: O G1 entrou em contato com a assessoria de imprensa do deputado, mas ainda não obteve retorno.
Paulo Melo: Em nota, o parlamentar informou que esta "à disposição da
justiça" irá "contribuir com as investigações".
"Não tenho nada a
esconder.
Minha vida política sempre foi muito clara, todas as
contribuições recebidas foram legais e declaradas na justiça eleitoral",
comunica o texto.
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